CARTA ABERTA AO PRESIDENTE BOLSONARO
Em defesa das Universidades públicas, autônomas, democrática e socialmente referenciadas.
Senhor Presidente,
Nos regimes democráticos do Ocidente, as universidades ocupam papel central como instituições produtoras do conhecimento. Sua relevância no fortalecimento da soberania nacional, quando reconhecida pelos governos, potencializa não apenas a difusão da ciência, mas, também, a ampliação da cidadania, das oportunidades, de direitos, por meio da qualificação profissional e da formação humanística, gerando, consequentemente, prosperidade às nações.
No caso brasileiro, infelizmente, demoramos a aprender essa lição. Somente no século XX as universidades se estabeleceram como espaços legítimos de produção do conhecimento. Cientes da importância das IFES no desenvolvimento do Estado brasileiro, as universidades tiveram sua rede ampliada.
As marcas desse processo ainda hoje repercutem na estrutura organizacional e político-administrativa das nossas universidades. A Constituição cidadã – um marco no avanço da democracia brasileira – assegurou, em seu artigo 207, o direito à “autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, obedecendo ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.
Aos proponentes da Carta Magna do Brasil, a autonomia universitária só poderia ser imaginada e praticada enquanto componente indissociável da democracia interna das IES, fundamento básico para pensarmos, naquela época e hoje, a carreira docente, a gestão patrimonial, as políticas de financiamento para ensino, pesquisa e extensão, os projetos político-pedagógicos, a política de pessoal e, sobretudo, a autonomia na elaboração dos processos de escolha de seus dirigentes.
Infelizmente, nos últimos anos, a Educação e, em especial, as universidades públicas vêm sofrendo duros ataques, mediante uma implacável política neoliberal cujo principal objetivo é sucatear as universidades, seja através do contigenciamento do orçamento das IFES e/ou reduzindo ao mínimo o investimento nos órgãos públicos responsáveis pelo fomento à ciência e tecnologia para, como isso, entregar o destino do ensino superior à iniciativa privada.
Diante desse cenário desanimador, nos últimos meses, Vossa Excelência decidiu nomear diversos reitores, muitos dos quais em segundo e terceiro lugares na composição da lista tríplice (e até fora da mesma) de suas respectivas universidades. Tais atos, além de contrariarem a CF/88 – uma vez que ferem de morte a autonomia universitária, resultando em ações como a ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade – e ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, interpostos pelo Partido Verde – PV e OAB, respectivamente, junto ao STF – agridem a própria Administração Pública e seu preceito constitucional referente ao “Princípio da impessoalidade”.
Desse modo e ao arrepio da lei, ao não nomear o primeiro colocado da lista tríplice, Vossa Excelência menospreza a decisão da comunidade acadêmica, baseada em regras historicamente estabelecidas, unicamente em observância aos seus próprios interesses, rasgando, com isso, a Constituição e pondo em xeque a democracia e a forma republicana do bem lidar com a administração pública.
Assim, e em Assembleia Geral Virtual, realizada no dia 23/11/2020, a diretoria da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Piauí – ADUFPI e seus associados /associadas manifestam total defesa das Universidades públicas, autônomas, democrática e socialmente referenciadas, ao tempo em que repudiam a maneira autocrática que Vossa Excelência vem conduzindo as nomeações de Reitor(a) e Vice-Reitor(a). Nos colocamos em posição de resistência contra esses atos e em defesa da autonomia universitária e da democracia nas Instituições Federais de Ensino Superior.